sábado, 6 de dezembro de 2008

“RITMOS CRUZADOS” : A PRESENÇA DE ESTRUTURAS E CONCEITOS MUSICAIS AFRICANOS NA MÚSICA BRASILEIRA

Introdução

Música pertence ao domínio cultural que se convencionou em definir como imaterial. Esta imaterialidade da cultura já se encontra nos primórdios da presença africana em solo brasileiro, pois quando conseguiam manter-se vivos na travessia transatlântica, os africanos recém-chegados não carregavam nada mais consigo do que idéias, crenças, concepções, dentre as quais também a sua musicalidade.
Os fenômenos musicais brasileiros historicamente vinculados às culturas africanas, são, até hoje, revestidos de adjetivos que em si refletem o que chamaria de clichês de africanidade: “é uma música cheia de ritmo”, “é percussiva”, “alegre”. Ao lado destes adjetivos, que seriam “positivos”, encontramos outros menos favoráveis, comentados por leigos e que a caracterizaram como “primitiva”, “musicalmente pobre” e “ruidosa”.
Muito além de clichês pré-concebidos como os mencionados, aos quais também se somam preconceitos científicos, que sustentam hipóteses de miscigenação, de hibridismo cultural ou mesmo de uma suposta africanidade reconstruída, a música nos mostra que não existe fusão total de seus diferentes elementos culturais, uma fusão que fosse capaz de diluir marcas e estruturas de origem e de estilos. Justamente por manter seus vestígios como poucos outros domínios de cultura, a música consegue ser manifestação do presente sem deixar de reportar-se, simultaneamente, ao passado.
Com este ensaio pretendo não mais do que retomar brevemente alguns pontos de uma Antropologia da Música preocupada com os dois lados do Atlântico Sul, e que já vem sendo discutida faz pelo menos duas décadas, mas que somente agora, mais recentemente, contribui com alguns de seus conceitos aos Cultural Studies, em especial também à teoria literária africana e latinoamericana 1.

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